Dois tracinhos
Barrigudos
Vamos começar pelo começo. No fim do ano, minha menstruação não veio.
Pensei que fosse porque ela tinha parado de tomar a pílula há um mês. Descontrole hormonal, fase da lua, essas coisas…
Mas eu sempre fui superregulada. Menstruação reloginho. Desconfiei que estava grávida mesmo.
Eu duvidei. As histórias que tínhamos escutado diziam que a gravidez demoraria um ano para acontecer. Pelo menos. E aquele era o primeiro mês que tentávamos.
Para tirar a dúvida, comprei um teste de farmácia. Era primeiro de janeiro. Eu ia descobrir se seria mãe no primeiro dia do ano.
Acordei às quatro da manhã com uma vontade incontrolável de ir ao banheiro. Chacoalhei o Torero e disse: “Eu não estou conseguindo mais aguentar. É agora!”
Levantei meio zonzo e fui procurar a câmera.
Eu tranquei a porta do banheiro para ele não entrar. Xixi é um ato sagrado. O último refúgio da privacidade é a privada.
Logo se vê que você nunca foi num banheiro masculino de estádio de futebol.
E nem pretendo! Mas voltando à história, lembro que Torero gritou de fora do banheiro: “Não olha o resultado antes de mim!”. Respondi: “Sério? Você vai querer o meu xixi?”
“O xixi, não. Só a fita.”
Assim que fiz todo o procedimento, abri a porta e ficamos olhando para aquela tirinha de papel. Em segundos o resultado estava lá: dois tracinhos.
“Dois tracinhos é o quê?”
“Positivo”, respondi. Depois só lembro de ouvir uns cliques de máquina. Ele estava tirando fotos de mim, da fitinha e do meu cabelo desgrenhado matinal.
Ficamos um tempo em silêncio. No meu caso, porque eu não estava acreditando muito. Engravidar na primeira tentativa parecia estatisticamente pouco provável. Era como fazer um gol do meio de campo. E eu já perdi muitos na pequena área. Então perguntei: “Quanto custou esse teste?”
“Quatro e cinquenta.”
“Quatro e cinquenta? Isso deve ser uma porcaria, Rita. Não dá para acreditar que um teste para uma coisa tão séria custe o mesmo que um pão na chapa e um pingado.”
Ele acabou me convencendo, mesmo eu sabendo que, quando estes testes dão positivo, têm 99% de chances de estarem certos. Mas é que eu também não acreditava muito que iria engravidar tão rápido. Todos os exemplos ao meu redor diziam que teríamos uma jornada longa e difícil.
Dois dias depois fizemos o teste de sangue. Esse foi dez vezes mais caro: quarenta e cinco reais. Aí confiei.
Ficamos a tarde inteira entrando na internet a cada cinco minutos para saber o resultado.
Como ele não saía, eu fui correr e ela foi caminhar. Marcamos de chegar em casa dali a uma hora.
Chegamos praticamente juntos. Ele estava todo suado e a primeira coisa que fez quando pisou em casa foi entrar na internet de novo.
Dessa vez o resultado estava lá: “Reagente”. E, logo abaixo, havia uma explicação para analfabetos gestacionais como eu: “Mulheres gestantes….Reagente”. Lágrimas começaram a rolar pelo meu rosto e se misturavam com o suor. Minha cara ficou empapada e nojenta.
Mas desta vez eu nem liguei de abraçá-lo e beijá-lo.