Barrigudos

Pondo a barriga no trombone

Barrigudos

Uma das coisas mais interessantes de engravidar é contar para os outros e ver as suas reações.

Principalmente porque, no nosso caso, não fizemos alarde que queríamos ter filho.

Então era sempre uma surpresa. Uma novidade espetacular!

Contei para duas amigas por telefone. Uma gritou por um minuto. A outra, por dois.  Mulheres comemoram gritando.

Para meu amigo dentista contei de uma maneira sutil. Fiz uma limpeza e, antes de sair do consultório, disse como quem não quer nada: “Ah, ia esquecendo de contar uma coisa sem importância: a Rita está grávida”. Ele nem ligou para a ironia. Seus olhos se encheram de lágrimas na hora e ele me abraçou como se eu tivesse feito um gol na final do campeonato.

Mas nem todo mundo fez festa. Algumas pessoas receberam a notícia de forma inesperada. Um amigo nosso ficou mudo durante alguns minutos. Parecia que não tinha ouvido. Só depois de muito tempo deu parabéns. E com um semblante sério.

Pois é, em geral, os amigos sem filho tiveram uma reação mais contida.

Como se tivéssemos traindo o grupo, abandonando o clube…

… trocando de partido, mudando de religião.

Parece que há uma certa cumplicidade entre os casais sem filhos.

Esta cumplicidade está numa ideia de felicidade que independe de ter filhos ou não. Então, num primeiro momento, a notícia gerou uma estranheza para este grupo. Mas depois eles começaram a se acostumar com a ideia, a dar presentes etc…

Já os casais com filhos passaram a nos convidar para jantares e compartilhar a vasta experiência na lida com estes pequenos seres. Estávamos entrando para outro clube.

Imagine que um político larga o PT e vai para o PSDB. Ou vice-versa. Esse sujeito será recebido como alguém que viu a verdadeira a luz.

Se por um lado, estávamos nos divertindo contando a notícia para os amigos, fiquei muito desconfortável de contar a notícia para meus clientes.

Acho que você tem que explicar um pouco o seu trabalho.

Sou consultora de negócios e trabalho em vários projetos ao mesmo tempo. Ao longo de quinze anos de vida profissional, passei por mais de cem empresas. E uma coisa eu sempre soube: a gravidez de uma funcionária nunca é celebrada pelo empregador. Em geral uma grávida não poderá se sujeitar a horas extras intermináveis, terá mal-estares que podem comprometer sua performance e o lado emocional fica aflorado, o que é um estorvo para muitos chefes. Sem contar que, durante alguns meses de licença remunerada, a empresa terá que arrumar um substituto e pagar por ele.

Gasto duplo e o risco de um serviço pior. Não sei como ainda não proibiram as mulheres de engravidarem.

Tenho certeza que, se não tivéssemos leis que protegessem a estabilidade de emprego das grávidas, a fila dos desempregados estaria cheia de barrigudas. Existe uma carapuça politicamente correta que faz com que a empresa engula a gravidez da funcionária. O que pode ser um pouco melhor numa organização que tenha muitas mulheres. Porque elas vivem a mesma realidade e têm uma cumplicidade. Ainda assim, cansei de ouvir reclamações de chefas-mães sobre suas funcionárias grávidas.

Nas entrevistas de emprego, aposto que devem perguntar para as mulheres se elas estão planejando ter filhos.

E perguntam mesmo.

Quem disser “sim” deve perder pontos.

Demorei muito para contar para os clientes. Uns quatro meses. Eu trabalho por projeto, não tenho carteira assinada. Então fiquei até com medo de que me dispensassem assim que soubessem da gravidez. Felizmente, não foi o que aconteceu. Por dois motivos: tenho clientes que compreendem a situação e tenho me esforçado muito para manter a mesma performance.

Sou testemunha disso. Ela está dormindo mais em cima do computador do que travesseiro.

Mas tenho um medo constante do que vai acontecer com a minha carreira depois que eu tiver o bebê. Depois de alguns meses de licença não remunerada, não sei se continuarei a ser contratada no mesmo ritmo de hoje. Os empregadores podem ter receio de que eu seja mais mãe do que profissional.

Já para mim, a gravidez da Rita pega bem. Eu passo a ser considerado um cara mais sério, um sujeito que precisa se esforçar mais no trabalho, porque, afinal, tenho que prover uma família.

Eu começo a entender agora porque existem tantos artigos dizendo o que as mulheres têm que fazer para conciliar carreira e filhos.