Não basta ser competente, tem que ser gente
Barrigudos
(Hoje quem conta sua história no Barrigudos é a Isabel, mãe de Lea. E ela mostra claramente a diferença que pode fazer um atendimento mais humanizado.)
Depois de descobrir que teria uma menina, escolher o nome, finalizar o curso de gestante voltado para o parto normal e preparar o enxoval, só me restava esperar, mas não por muito tempo. Ao completar 34 semanas de gestação, fui internada por apresentar quantidade de líquido amniótico abaixo do normal. A Lea nasceu no dia 29 de dezembro em uma cesariana de emergência (não senti nem a anestesia) e eu acreditava que a evolução seria como a de qualquer outro bebê, já que ela nasceu chorando muito. Ao retornar ao quarto, recebi a notícia de que ela teve um desconforto respiratório, necessitou de respiração mecânica e estava recebendo diversos medicamentos.
Daí em diante, eu era a própria mocinha no início das novelas: chorava a cada cinco minutos. O hospital era ótimo nos cuidados, na equipe técnica e nos equipamentos. Meus pais são pediatras e elogiaram muito a conduta e os médicos. O grande problema e motivo das minhas lágrimas constantes era a parte “humana” do hospital, ou melhor, a falta dela. No dia do nascimento, quando já conseguia andar, implorei à médica de plantão na UTI para vê-la, pois no parto mal consegui ver rostinho da minha princesa. Visita negada. Para minha sorte, algo aconteceu naquela noite e o outro médico que foi substituí-la me chamou por volta da meia-noite. Chorei de emoção ao vê-la bem pequena, com muitos fios em volta.
Fé e o apoio da família e amigos foram o que me fizeram suportar aquele mês de janeiro tão longo.
As visitas ocorriam uma vez ao dia, no final da tarde (inacreditável, não?) e havia um boletim médico na hora do almoço, que podia ser passado pelo telefone ou pessoalmente. Fui algumas vezes até a porta da UTI, conversei com o médico do plantão, mas não era permitido entrar nem por cinco minutinhos. Na maioria dos dias, minha mãe entrava em contato, já que ela podia conversar “de médico para médico”. Esse horário era um momento de desespero, tanto para mim quanto para minha mãe, pois nem sempre era fácil conseguir contato rapidamente e eu esperava o retorno dela angustiada; se demorasse um pouco mais que o habitual, eu entrava em desespero, sempre achando que receberia uma notícia ruim. Foram quinze dias no tubo, passando para o CPAP e oxigênio por mais um ou dois dias. Pude pegá-la no colo com vinte dias de vida, mas não era permitido retirá-la da incubadora diariamente. Dependia da boa vontade do médico de plantão.
Nesse período não tive orientação para a retirada do leite. Eram fornecidos recipientes para armazenamento apenas quando solicitados. Quem fez essa orientação foi minha mãe, que alugou uma bomba extratora elétrica. Retirava de três em três horas, inclusive de madrugada, a fim de manter a produção e amamentar quando possível. Quando a Lea foi liberada para mamar no peito, só era permitido em dois horários (um pouco antes da visita e assim que a mesma era encerrada). Nos outros horários, eles diziam oferecer as mamadeiras com o leite enviado, só que não. Tanto na UTI quanto no berçário, mesmo retirando a quantidade de leite suficiente, armazenando e etiquetando com data e hora, era oferecido o leite artificial em uma mamadeira (é fácil notar a diferença, pela cor e pelo cheiro). Questionei duas vezes a enfermagem e a equipe de nutrição, e estou aguardando a resposta até hoje.
Nos vinte e seis dias que a Lea esteve na UTI não recebi nenhuma visita ou contato de assistente social ou psicólogo. Não tive nenhum gasto extra nesse período, pois meu convênio cobria todos os serviços, porém observei que alguns pais recebiam bilhetinhos solicitando uma visita à tesouraria e eles voltavam bem preocupados.
Já no berçário, o horário de visita começava a partir do meio-dia. Foram mais quatro dias para estabelecer a amamentação e ganhar peso. Acreditava que teria orientação da enfermagem sobre o banho, a melhor posição para amamentar, a administração dos medicamentos, mas não.
O dia da alta foi incrível. A alta de um bebê prematuro é quase como o nascimento de um bebê a termo: muita emoção e alegria. Nem pensei em colocar uma saída de maternidade: ouvi as orientações da pediatra, peguei a documentação dela e saí sem olhar para trás.
Sou grata pelos cuidados que tiveram e que garantiram a sobrevivência da minha filha, mas fica claro que ser mãe de prematuro é uma experiência que envolve muitos sentimentos (medo, insegurança, desespero, alívio e alegria algumas vezes). Ter apoio e acolhimento da equipe hospitalar é essencial.
Isabel Serson