Praia, susto e UTI
Barrigudos
(A história de hoje foi enviada por Kenji e Denise. Ela conta como é o susto de você estar em férias numa bela praia e, de repente, seu bebê começar a nascer dez semanas antes do esperado)
O mês era janeiro, o ano 2012.
Somos de São Paulo, capital, e estávamos de férias no Rio de Janeiro, mais especificamente em Arraial do Cabo. Eu, meu marido, minha filhinha de 29 semanas na barriga, minha filha de coração de 16 anos, meu sogro, sogra, cunhados e cunhadas. Fomos para lá dia 8 e ficaríamos até o dia 18. Disse ficaríamos porque tivemos de voltar antes.
Dia 13 me senti muita tontura e fomos medir minha pressão. Ela bateu 22/16. Na hora ligamos para a minha médica, que nos orientou a procurar um hospital para que tentássemos ouvir os batimentos da nossa filhotinha.
Antes de irmos viajar, meu marido pesquisou onde tinha hospitais próximos de onde estávamos, e já tínhamos endereço e tudo mais em mãos. Chegamos lá e, para nosso azar, por ser uma sexta-feira não tinha nenhum ginecologista ou obstetra. Ficamos com o clínico geral mesmo.
A consulta com ele foi bem improdutiva porque não conseguimos nem ouvir o coração do bebê e nem saber de nada.
Saímos de lá e ligamos para a médica novamente. Ela nos orientou para que tentássemos algum outro local em que pudéssemos fazer um ultrassom. Perguntei na recepção do hospital se teria algum outro na região e a atendente me indicou o Hospital de Referencia da Mulher de Cabo Frio, um hospital do SUS que era especifico para isso. Passamos lá, o médico colocou o aparelho e ouvimos os batimentos do bebê. Ele me recomendou repouso absoluto até o retorno da viagem.
Voltamos para o apartamento e fiquei descansando. Porém de tarde estava muito mal e retornei para o hospital. Quando cheguei lá, o médico me internou e fiquei lá por 3 dias praticamente sem fazer nada e sem atendimento algum. O hospital era muito ruim. Como quase todo hospital público do Brasil, faltavam equipamentos, medicamentos, até mesmo papel higiênico no banheiro. Chorava todos os dias. Meu marido vinha me visitar duas vezes ao dia. No terceiro dia pedi para ele me tirar de lá. Como a pressão não baixava de jeito nenhum e não estava tendo suporte algum no hospital, conversamos com a enfermeira responsável e ela mesma disse que, se fosse da nossa vontade, poderíamos sair sem problema algum. Pegamos nossos documentos e fomos embora de lá ''fugidos''.
Chegamos em São Paulo às 4 da manhã. Descansamos um pouco e às 6 da manhã já estávamos de pé, pois meu marido tinha conseguido um encaixe no cardiologista. Ele mandou que eu fizesse repouso absoluto e tomasse uma medicação. Fomos descansar um pouco, cochilamos e acordamos 9 da noite. Meu marido estava muito preocupado com o bebê e perguntou se ela tinha chutado alguma vez. Respondi que não. Ele então falou para irmos para algum PS para que pudéssemos ver se estava tudo bem.
No hospital fizemos o ultrassom e me encaminharam para outra sala onde colocaram um aparelho para medir os batimentos da nossa bebezinha. Os batimentos estavam fraquinhos. Então logo chegaram algumas enfermeiras, uma com soro, outra com uma cadeira de rodas, e o médico. Ele falou que o parto teria de ser feito logo, porque o liquido amniótico dentro do útero era pouco e o bebê já estava sofrendo. Eu entrei em choque, não esperava por isso, ninguém espera.
Subi para o centro cirúrgico chorando e muito preocupada. Me despi, coloquei o avental e aquele momento mágico do pai acompanhar o nascimento não aconteceu, pois ele teve de descer e cuidar da burocracia de internação e outras coisas.
A Manuela nasceu dia 18 de janeiro de 2012, 1h19 da manhã. Tinha 30 semanas na minha barriga. Ela não chorou e em todos os testes feitos no nascimento ela teve a pior resposta possível. Eu não me aguentava e chorava muito. Queria saber o que tinha acontecido. Cadê minha filha? Por que ela não chorou? Cadê o meu marido que não está do meu lado?
Tantas perguntas e quase nenhuma resposta.
(Para não fugirmos do padrão dos criadores do blog agora quem conta uma parte da história é o pai)
Saí do centro cirúrgico e me encaminhei para o andar da UTI Neo. Eu precisava de notícias da minha filha. Cheguei lá e tinha uma porta fechada. Toquei a campainha e abriram a porta sem questionar. Pelo horário, por volta de duas da manhã, acharam que eu era funcionário e liberaram a porta sem que eu precisasse me identificar. Entrei na antessala da UTI e uma enfermeira veio falar comigo. Perguntei pela minha filha e ela foi se informar. Depois de alguns minutos, que pareceram anos, ela voltou e falou que o médico responsável estava cuidando dela, e assim que terminasse iria falar comigo.
Sai da UTI e fiquei lá esperando. Enfermeiros passavam por mim e estranhavam o que um homem estava fazendo sentado do lado de fora da UTI no meio da madrugada. A espera era angustiante.
As 3h30 o médico pediu para me chamar e entrei de novo na UTI. Cheguei lá e vi minha menininha bem magrinha, cheia de fios e entubada. Ela nasceu com 1.040 Kg e 39 cm. O primeiro contato é uma sensação estranha. Sabemos que é necessário tudo aquilo, mas a vontade é pegá-la e cuidar dela.
O médico falou que ela estava estabilizada e agora seria necessário tempo e muitos cuidados.
Fiquei mais alguns minutos lá e saí. Voltei para casa, onde nossa outra filha também estava angustiada. Apenas tomei um banho, peguei algumas roupas e voltei para o hospital.
Minha esposa ainda estava na recuperação. Ela foi liberada por volta do meio dia. Nesse meio tempo liguei para quem não tinha ligado ainda avisando do nascimento e visitei minha menininha mais uma vez na UTI.
Essa tarde minha esposa passou quase o dia todo descansando, pois estava bastante ''dopada'' por conta das medicações.
No dia seguinte, ela acordou um pouco melhor e iria conhecer a nossa filhinha.
(Mãe)
Desci para a UTI com as dores da cesariana. Meu marido me alertou a respeito dos tubos e fios para que eu não ficasse impressionada. Cheguei lá e fiquei muito emotiva. Por que minha filha tinha tantos tubos e fios nela? Quase desmaiei de vê-la daquela maneira. Meu marido precisou me segurar, pois fiquei bem tonta.
Voltamos para o quarto e aí a luta começou.
A Manu ficou internada 43 dias. Nesses 43 dias foi detectada uma hemorragia grau 2 no cérebro, ela recebeu infusão de sangue pois ficou anêmica, foram feitos inúmeros ultrassons, raios-x, exames de sangue, tomou banho de luz e eu fui para a salinha da ''ordenha''. Cada dia era um dia diferente e cada dia eu chorava e queria ela para mim.
Acompanhamos bebezinhos tendo alta e comemorávamos como se fosse o nosso. Nesses 43 dias, um bebê virou um anjinho e hoje cuida do papai e da mamãe dele lá do céu. Vida de UTI é dura.
Depois disso tivemos muitas consultas no pediatra, consultas na neurologista e fisioterapia. A Manu ficou internada mais 10 dias quando ela tinha 4 meses, por conta de um bronquiolite. Entramos na justiça para poder conseguir o Palavizumabe, um medicamento quase que essencial para bebês prematuros, que é muito caro e infelizmente o estado nega se pedirmos pelos meios comuns.
Manu caiu da cama, fez cocô no sofá, vomitou no pai, em mim, na cabeça da irmã quando estava de cavalinho. Tudo, tudo, tudo já aconteceu.
Hoje ela tem quase dois anos. Acha que toda criança é amiga dela, brinca com todo mundo, vai no colo de todo mundo, abraça, beija, come sozinha, escolhe o que quer comer. É uma criança que superou todos os atrasos e dá um baile em muita criança nascida a termo.
Bem que me diziam e agora digo para vocês: Criança prematura surpreende a gente, e é mais danada que crianças nascidas ''normais''.
Denise e Kenji
(Se você quiser contar sua história de UTI, mande o texto para torero@uol.com.br)