Barrigudos

Estou grávida, me engessem!

Barrigudos

Eu fiquei abobada depois de ter certeza da gravidez.

Eu também. Pensei que teríamos uns seis meses de tentativas, e assim iria me preparando psicofisicoespíritofinanceiramente. Mas veio de cara. Ainda bem que a gravidez dura nove meses, assim dá tempo de se acostumar com a ideia.

Eu me sentia muito aflita, sem informação. Podia tomar café? Aspirina? Correr? Andar de bicicleta? Por aqueles dias evitei tudo que parecesse comprometedor. Cheguei a dispensar uma sopa feita pela minha sogra porque tinha coloral. Vá saber se eu podia comer isso. Ela achou quase uma ofensa, e eu nem podia explicar nada, porque decidimos esperar um pouco para contar. Pelo menos, até o primeiro ultrassom.

Rita ficou cheia de não-me-toques. Ou melhor, cheia de não-toco-em-nada. Por exemplo, foi ao supermercado e carregou umas sacolas. Daí chegou chorando porque sentiu uma dor e pensou que iria abortar.

Mas estava pesado mesmo! Grávida não pode carregar muito peso.

A gravidez tinha só uns dias. Desconfio que era só desculpa para eu carregar tudo.

Imagina! Isso é uma calúnia.

O que eu sei é que desde aquele dia carrego tudo que passe de um quilo. E, estranhamente, também lavo toda a louça.

Eu sinto muito enjoo de louça suja.

Sei…

O que me deixava chateada era justamente essa constante dúvida sobre o que eu sentia, como se eu estivesse me aproveitando das coisas. Porque não dá para conceber o tamanho da mudança que a gente sente no corpo. Por exemplo, eu só queria chupar limão. E nunca gostei de limão.

Já ouvi falar de grávidas maníacas por limão. Mas a louça…

Enfim, como estávamos em época de feriado e demoraria para eu ter a primeira consulta, encarei uma longa pesquisa de internet para saber o que eu podia ou não fazer. A lista de não-podes era interminável.

Não lembro de ter lido nada sobre lavar louça.

Sushis poderiam estar contaminados por mercúrio, vários chás seriam abortivos, carne, frutas e legumes causariam toxoplasmose, refrigerante e café deixariam meu bebê com menos cálcio, queijos e saladas levariam à listeriose, sal causaria pressão alta, leite, sorvete e ovos provocariam salmonelose, mariscos estariam infectados por campilobactérias e álcool, nem pensar. Ou seja, pela segurança do meu bebê, eu sobreviveria a pão e água.

Aí pelo menos teríamos pouca louça suja.

O problema não era só o que eu não poderia comer. Eu não poderia mais passar cremes anti-idade, clareadores, pintar o cabelo, descolorir os pelos, tomar remédios, ficar no ar condicionado, andar de bicicleta e correr.

Também não podia ver filme iraniano, lembra?

É que começamos a ver um filme sobre mulheres iranianas e nos primeiros minutos uma delas abortava. Chorei por medo de aquilo acontecer comigo também. Foram duas semanas de muitas lágrimas, dúvidas, enjoo, dor de cabeça e sono.

Cheguei a pensar em colocá-la numa daquelas bolhas de plástico. Ou engessá-la.

Fiz uma lista com todas as minhas dúvidas. Deu três páginas. Na primeira consulta, que durou mais de duas horas, minha médica me deixou tranquila. Gravidez não era doença, não exigia penitência, não pregava o jejum e nem abolia a vaidade.

Acho que dá até para lavar louça.

Não vamos exagerar.