Barrigudos

Anjos de avental

Barrigudos

Desde pequena minha vó me ensinou a rezar para o meu anjo da guarda. Eu imaginava que esse anjo era um homem alto, com grandes asas, cabelo enrolado e roupa branca.

Mas a estadia de Matias na UTI neonatal me fez descobrir que os anjos não têm asas, são na maioria mulheres, vêm em todos os tamanhos e têm diversos tipos de cabelo. E mais: usam aventais.

São Anas, Márcias, Cidas, Jácis, Alices, Fátimas, Cristinas, Fês, Más, Cás, Pês, Lês, Máris, Tátis e Marias.

Não importa se são fisioterapeutas, fonoaudiólogas, enfermeiras, médicas ou auxiliares de enfermagem. Elas voam de um lado para outro atendendo pedidos, socorrendo quem precisa, aliviando dores, salvando vidas.

Mas afinal, o que levou essas mulheres a seguirem a carreira de cuidar dos outros e passar a trabalhar em um berçário de alto risco?

Algumas, como Janaína e Helenice, cuidaram de parentes doentes e isso despertou nelas a vocação do cuidar.

Monaliza e Claudia sonhavam em se tornar médicas. A fisioterapia e a enfermagem foram as formas que elas encontraram de chegar mais perto deste sonho.

Patrícia e Adriana começaram a trabalhar no hospital em funções administrativas, mas se apaixonaram pelos cuidados com os bebês.

Já Aline sabia que gostaria de trabalhar na área de saúde. No estágio viu gente morta e não se impressionou. Então achou que deveria continuar na faculdade de enfermagem.

A maioria dos anjos de avental não pensa em mudar de profissão nem quer sair da área neonatal.

É o caso de Aninha, que trabalhava na farmácia do hospital. Ela conheceu a enfermagem, se apaixonou pelo trabalho com prematuros e está realizada. Quem a vê cuidando dos bebês percebe que ela tem um dom especial.

Eu pensava que seria muito mais fácil ser mãe se soubesse o que elas sabem. Mas Roberta, superexperiente com bebês prematuros extremos, me acalmou. Ela contou que quando teve o seu primeiro filho passou a primeira noite acordada, olhando para ele, com medo que sufocasse. Ela teve medo de algo acontecer e não ter em casa todo o equipamento ao qual está acostumada.

Pelo jeito, ser mãe iguala a todas nós.

Os anjos de avental cuidam de nossos filhos até melhor do que poderíamos cuidar. É impressionante observar como tratam de seres tão pequenos com tanta destreza e confiança. Ao mesmo tempo em que falam com os bebês fazendo vozes infantis, elas passam cateteres, caçam veias minúsculas, fazem curativos, administram medicamentos e colocam sondas.

Fica em mim uma sensação de agradecimento profundo a todas essas mulheres. Elas ajudaram a salvar a vida do meu filho. E isso mãe nenhuma esquece.

É manhãzinha de terça-feira. Entro na UTI e a movimentação é grande. Lá vão os anjos de avental cuidar de Isabelas, Sofias, Lauras, Marias, Eduardas, Pedros, Bentos, Mateus, Arthurs, Marcelos, Gabriéis e do meu Matias.

Acho que, além de rezar pelo meu anjo da guarda, passarei a rezar para elas.