Barrigudos

A última cruzada

Barrigudos

O post de hoje chegou tarde. Mas há uma boa desculpa. É que eu estava vivendo a parte final da saga “Em busca da mamadeira sagrada”.

Para quem não leu a primeira parte, eis o resumo em duas linhas: Matias precisa de leite especial e tentei, sem sucesso, consegui-lo via governo estadual (o link é este: http://barrigudos.blogosfera.uol.com.br/2013/09/21/em-busca-da-mamadeira-sagrada-ou-o-cacador-do-leite-perdido/).

Mas não desisti. Fiz o que manda a antiga música cantada por Maria Bethânia: “Lutar, quando é fácil ceder, vencer o inimigo invencível!”

Pedi um novo relatório médico à pediatra, desta vez bem comprido, cheio de nomes difíceis e contando a história de Matias tintim por tintim.

Depois preparei minhas armas para a batalha de trincheira: um computador para trabalhar na cadeira de espera e um romance para ler quando cansasse de trabalhar. Além disso, botei sapatos confortáveis e conferi sete vezes se estava com todos os documentos.

Com meu arsenal preparado, botei a mochila nas costas e acelerei meu possante em direção à rua Jequitinhonha.

Desta vez não havia lugar no estacionamento. Mal sinal. Onde há fumaça há fogo, e onde não há vaga há aglomeração. Contei 440 pessoas na sala espera. Aliás, é a maior que já vi.

Às 14h14 peguei minha senha. E quarenta minutos depois, um tempo bem razoável, entregava meus papéis para a atendente.

Seria eu novamente gongado? A pediatra teria feito um relatório comprido o suficiente? As palavras difíceis causariam boa impressão?

Apresento meus documentos. A atende olha-os com cuidado, para ver se não havia nenhum erro. Suo frio como um palestino entrando com passaporte falso em Israel. Por fim, ela não vê nenhum problema, entrega-me uma nova senha e leva a papelada ao médico.

Volto para meu lugar, abro meu computador e ponho-me a trabalhar (nestes tempos de Matias, até tenho gostado de pegar umas filas, porque é a única hora em que posso me concentrar de verdade).

Quarenta e cinco minutos depois vou até a atendente e pergunto se há alguma resposta. Ela diz que até agora não houve nenhum pedido negado. Minha respiração fica ofegante de ansiedade e meus olhos umedecem de esperança.

Mas o tempo passa e nada acontece.

15h15.

16h16.

17h17.

Já cansei de trabalhar no roteiro que estava escrevendo. Como não conheço ninguém e sou ruim para puxar conversa, pego meu romance japonês e começo a lê-lo. Infelizmente o autor gosta de descrever as cenas de comida com muito realismo, e isso atiça minha fome. Eis algo que faltava na minha mochila: alimento. Não como nada desde o meio-dia. Penso em ir até a rua comprar uma deliciosa e engordurada coxinha. Mas e se justo nesta hora me chamam? Não, não posso esmorecer. Mastigarei meus próprios dentes se for necessário, mas não arredarei pé dali.

17h44. No placar eletrônico surge o número 9093. É o meu! Levanto-me emocionado e vou até o guichê. É uma outra atendente. Seu nome é Maria. Ela fica olhando alguns papéis e demora para revelar o veredito. Será uma masoquista? Sim, deve ser. Consigo imaginá-la numa roupa de couro e segurando um chicotinho.

Então, lentamente, seus lábios se abrem e escuto a frase mágica: “Seu processo foi aprovado”.

Ouço trompetes dando vivas e vejo fogos de artifício explodindo no céu. Sim, eu consegui. Pergunto o que devo fazer, quando devo voltar para pegar as latas, etc…

Mas Maria, que agora me parece a santa progenitora (até posso imaginá-la de véu azul) diz que devo apenas assinar no “x” e já posso levar o leite agora.

Fico pasmo. Já? Não terei que esperar um mês?

Não. Ela me passa uma caixa sobre o guichê. O leite do neném está garantido. É a glória! Consegui vencer a burocracia. O Estado me deu algo em troca de meus impostos.

Enquanto volto para casa, nem reclamo do congestionamento da marginal. E os faróis dos carros parecem pirilampos que dançam para comemorar minha vitória.