Barrigudos

As emoções de uma ida ao pediatra
Comentários 3

Barrigudos

Ir ao pediatra é como um plantão de dúvidas sobre química orgânica para um vestibulando, ou seja uma chance de fazer milhares de perguntas.

Pois bem, esta semana levamos Matias à sua pediatra. Num caderninho tínhamos 14 perguntas anotadas. Desde “O que é esta manchinha branca” até “Estamos colocando muita roupa nele?”

Os pediatras talvez sejam os médicos mais pacientes da classe médica. Para suportar as perguntas dos pais, há que ser um tanto monge budista.

No fundo, tudo o que um pai quer é ouvir que ele está fazendo tudo certo e que seu filho está lindo e perfeito.

Se os pais não aprenderam na escola que não há pergunta boba, aprendem no consultório do médico. Lá não há timidez, não há espaço para dúvidas. Perguntamos o que é cada cisco, cada pintinha, cada tipo de arroto do bebê.

E lá vai o pediatra pacientemente respondendo o que já deve ter respondido um milhão de vezes.

Desta vez perguntamos coisas como: Ele tossiu ao dormir, é refluxo? O cocô saiu mais escuro, é normal? Quantas vezes podemos dar este remédio por dia? Tem um remédio menos amargo que aquele? Ele gosta de dormir mais do lado direito, tudo bem? Há uma vermelhidão por baixo de onde ajustamos a fralda, será alergia? Essa manchinha vermelha no olho vai sumir? Aliás, já dá para saber de que cor serão os olhos dele? 37,1 graus já é febre? Qual o limite de leite por mamada? Mesmo em dias muito frios temos que lhe dar banho?

Todas as respostas para nossas perguntas foram tranquilizadoras. Então passamos à fase seguinte, que é a pesagem do bebê. Ela corresponde mais ou menos à prova de redação no vestibular. É uma chance para tirarmos uma bela nota ou para sermos reprovados.

Ficamos de olho nos números vermelhos da balança. Eles iriam dizer se Matias ganhou o peso necessário ou não. Para nosso azar, ele fez um cocozão antes de sair de casa, com o que perdemos boas gramas, e por isso estávamos tensos.

Mas mesmo assim passamos com louvor. Matias ganhou quase 800 gramas em 15 dias. Pena que esquecemos de levar rojões.

Estava tudo divino maravilhoso, como na música cantada pela Gal. Mas, quando já estávamos saindo, Rita lembrou de uma última pergunta, que estava no verso da página de nossa lista.

“Vi uma gotinha de sangue no cocô dele. É de fazer força?”

Uma sombra passou pelo rosto da pediatra, que disse: “Eu já ia dar alta para vocês, mas agora teremos que fazer uns exames para investigar o que é isso. Pode ser uma intolerância ao leite de vaca. E isso pode gerar uma colite. Se nos próximos dias sair muito sangue alguma vez, não se assustem.”

Eu nem sabia que havia leite de vaca na fórmula do leite artificial. Para mim era só química. De repente me senti ignorante.

E eu me senti com muito medo e culpa. Se eu não estou conseguindo produzir leite materno suficiente e ele está precisando tomar complemento, o que ele vai tomar?

Agora estamos apreensivos com o resultado dos exames. Será que ele não poderá mais tomar a fórmula? Essa intolerância ao leite, se comprovada, pode durar muitos anos e prejudicá-lo?

Já fomos ao pediatra, ao nosso plantão de dúvidas.

Agora teremos que enfrentar os exames de química orgânica. No caso, os exames de Matias.

Só aí sentiremos o alívio da aprovação. Ou tomaremos bomba.


Matias está falando!
Comentários Comente

Barrigudos


Não, não é que ele seja um bebê precoce, um gênio de fraldas. É que ele fala através de caras, bocas, gestos, sons e choro. Muito choro.

Como pais de primeira viagem, ficamos um tanto perdidos com os sinais que ele nos dá. Qual a diferença entre o choro de fome e o choro de cólica? Quando ele enruga a testa é sensibilidade à luz ou sinal de que está enfezado?

O único sinal que eu conheço é o bocejo, porque tenho feito muitos desde que Matias nasceu.

O ideal seria que criassem um Baby Translator, uma máquina que pudesse traduzir instantaneamente a linguagem dos bebês.

Assim, era só Matias fazer algum grunhido que o Baby Translator o traduziria como “Quero mamar”, “Fiz cocô” ou “Me deixe pelado, sou um nudista”.

Eu li que um pessoal da Universidade Brown, nos Estados Unidos, está quase chegando lá. Mas enquanto a tecnologia não avança, recorremos aos livros. Em um deles encontramos uma tabela que decodifica os gestos, sons e choro dos bebês.

Mas não deu muito certo. Provavelmente porque o livro é norte-americano e os bebês de lá gemem em inglês.

De qualquer forma, com o tempo fomos melhorando nosso vocabulário bebeliano.

Por exemplo, soluço quase sempre é frio. Já quando ele passa as mãos pelo rosto insistentemente é cólica.

O choro sem lágrimas que ele faz quando estamos mudando sua roupa significa: “Soltem-me, seus torturadores! Por que vocês têm que me colocar dentro desses bodies-de-força?”.

Além do choro e dos gestos, há uns barulhinhos diferentes. Os bebês prematuros fazem alguns sons diferentes dos bebês a termo. São uns grunhidos que lembram vários animais, como cabritinhos, galinhas, golfinhos e pôneis.

É como se tivéssemos uma fazendinha em casa. Se é que alguma fazenda tem golfinhos.

Até agora sabemos que o barulhinho do tipo relincho é como uma reclamação ao acordar, como “Me deixem dormir!” ou “Mais cinco minutinhos, por favor”. Já durante o sono ouvimos o barulhinho tipo cabritinho, que deve significar “Estou dormindo profundamente, não me acordem”. E desconfiamos que o cacarejar seja ''Troquem minha fralda, escravos!''.

O som de golfinho ainda é um mistério. Talvez só Flipper possa traduzi-lo.

O pior é tentar identificar o choro. Dá até vontade de chorar por não entender o que ele significa.

Mas um tipo de choro a gente já conseguiu captar: é o choro por colo.

Ele sempre acontece quando Matias está no berço e percebe que estamos por perto. Aí ele chora bem alto e com gritos longos.

Mas para imediatamente quando o pegamos no colo.

Na verdade, Matias ainda não está falando. Mas já sabe fazer chantagem emocional.

 

 


Inutilidades ultra úteis
Comentários 2

Barrigudos

(Rita escreve em preto, Torero em azul)

 

Pensei que eu seria um pai anticonsumista. Nada de inutilidades tecnológicas e frescuras moderninhas comigo. Eu seria simples, estóico, um pai que usaria apenas suas mãos nuas para cuidar de seu filho.

Eu pensei que seria uma mãe à antiga, fazendo as coisas por mim mesma, sem nenhum recurso eletrônico. Não chegaria a usar fralda de pano, mas quase.

Porém, ganhamos alguns apetrechos high tech de amigos e nos rendemos.

Para quê viver como no século XIX se estamos no século XXI? Este “I” que sai do meio e vai para a ponta direita tem que fazer alguma diferença.

Eis aqui alguns acessórios inúteis que se revelaram muito úteis:

Termômetro de água: Quando Rita quis comprar um, eu protestei: “Era só o que faltava. Basta colocar o dedo na água e já sabemos a temperatura. Se meus pais não precisaram disso, eu não vou precisar”.

Ah, quanta ingenuidade. Só depois que ganhamos o tal termômetro (que tem o formato de uma prancha de surfe) é que vimos como calculávamos mal a temperatura da água.

Não é à toa que Matias ficava molinho depois do banho. Deixávamos a água um tanto acima da temperatura ideal. Ele tomava não só um banho, mas também uma sauninha relaxante.

Termômetro de orelha: Eu nem sabia que isso existia. Parece coisa de Jornada nas Estrelas (aliás, como o celular, que lá se chama transcoder). Mas é um treco muito útil. Você não precisa ficar segurando o bracinho do bebê enquanto o termômetro faz seu trabalho. Ele solta uma luzinha e pronto, já mediu a temperatura. É rápido, eficiente e silencioso. O contrário do Congresso.

Babá eletrônica: Ideal para pais escritores. Quando Rita desaba, digo, tira uma sonequinha, eu posso ficar escrevendo e de olho em Matias ao mesmo tempo. Qualquer barulho ou movimento e lá vem a imagem do pequeno. Com isso dá até para tomar banho de vez em quando.

Miniberço: Quando o vimos pela primeira vez, achamos uma inutilidade. Para que um berço tão pequeno? É melhor um grande, que fica com ele por mais tempo.  Mas não sabíamos que teríamos um prematuro. Então alugamos um, que fica do lado de nossa cama. Nestes dois primeiros meses, é bom ter o Matias ali do lado.

Álcool-gel: É ótimo para aquela última desinfetada antes de pegar no bebê. Deixamos bem perto do berço. E, quando chego da rua apressado e esqueço de lavar a mão, sempre dá para disfarçar e dizer que ia passar o álcool-gel.

Papel-toalha: Não pensávamos que seria útil para bebê, mas é ótimo ter um rolo por perto na hora da troca. Ainda mais se o seu pequeno faz um perigoso cocô spray de vez em quando. Também é útil quando Matias faz xixi no meio da troca de fraldas, molhando tudo ao redor, inclusive eu, como se fosse um hidrante quebrado.

Cotonete especial: Ele tem uma ponta mais fininha, e assim é útil para tirar cotocos do nariz e cerotos mais profundos. De vez em quando até roubo alguns para uso próprio.

Ofurô: Na verdade é um grande balde transparente. Mas Matias gosta de tomar banho nele porque fica quase todo imerso.

É claro que nada disso é essencial. Nossos tatatatatataravós nem tinham energia elétrica, e conseguiram criar nossos tatatatatavós.

O amor dos pais ainda é a melhor tecnologia.

Mas, entre os Jetsons e os Flintstones, prefiro ficar com os primeiros. Embora, mesmo com toda a eletrônica, estejamos mais para os Simpsons.

 


Viva o cocô!
Comentários 3

Barrigudos

''O cocô é nosso amigo

O cocô é nosso irmão

Às vezes fica no umbigo

Mas é só passar sabão.''

Essa é uma musiquinha que fiz um dia desses enquanto limpava Matias. Já estou tão íntimo do seu cocô que consigo limpá-lo cantando.

Antigamente eu tinha nojo de cocô. Até do meu. Mas hoje o cocô faz parte da minha vida. O cheiro já não me incomoda, a visão já não enoja. Cocô é só cocô.

Por conta da consistência pastosa e da cor, Torero chama o cocô de Matias de acarajé.

Num bom dia, Matias pode fazer cocô até oito vezes. E uma dessas vezes pode ser um cocô a jato. Na primeira vez que vi isso, lembrei do filme “O exorcista”. Só que, em vez de vômito, Matias ejetava cocô. Mas ele não estava possuído, acho. Naquela primeira vez ele esguichou longe, atingindo todos os nossos apetrechos do trocador e chegando até a parede.

É o que eu chamo de “cocô spray”.

Pensamos que nunca mais iria acontecer, mas, por via das dúvidas, tiramos os apetrechos do trocador (fraldas, cremes, algodão, cotonetes, garrafa térmica, etc…) da linha de, digamos, tiro.

Porém, logo depois ele acertaria a parede uma segunda vez e uma terceira. O pior é que é uma daquelas paredes com textura. Gastamos um bom tempo limpando tudo.

A saída foi usar contact transparente.

Pensamos que, depois do contact, pela Lei de Murphy ele nunca mais faria seu cocô spray. Mas o plástico na parede já nos salvou duas vezes.

Chegamos até a pensar em comercializar uma linha de contact anti-cocô spray. Em vez de transparente, ele poderia ter um alvo com marcações de pontos. Ou o Congresso Nacional.

O curioso é que ficamos íntimos do cocô de Matias. Pela cor e pela consistência sabemos se ele foi feito mais de leite artificial ou mais de materno. E sempre em tons amarelados.

É terrível quando ele faz cocô durante a troca ou quando vaza para a roupa. Dá um trabalho danado. Mas o pior é quando o cocô não vem.

Recentemente, Matias ficou quatro trocas sem fazer cocô. Foi um problema. Ele continuava comendo bem, mas chorava com cólicas e nada. De vez em quando, fazia um punzinho e só.

Fiquei preocupado. Será que teriam que passar uma espécie de roto-rooter no meu filho? Recorreríamos aos antigos clisteres? Haveria um terrível aspirador cocozal?

Ligamos para a pediatra. Ela disse que aquilo era normal e que, se ele não fizesse cocô até o dia seguinte, usaríamos supositório para ajudar.

A palavra supositório caiu nos meus ouvidos como uma bomba. Memórias de infância foram desenterradas e me lembrei o quanto eu sofria. Segundo minha mãe, eu fui uma criança “ressecada”. O cocô não era meu amigo. Desejei muito que meu filho não tivesse que passar por isso. Fizemos massagem na barriguinha dele, cantamos as músicas pró-cocô inventadas pelo Torero e até ensaiamos com Matias uma dança para a divindade pastosa.

Deu certo. Durante a madrugada, no meu turno de troca e mamada, lá estava ela, a fralda cheia e amarelada, transbordando cocô body afora. Em outra circunstância, eu teria ficado enfezado de ter que limpar tudo, trocar toda a roupa de Matias, depois higienizar o trocador com álcool e por fim colocar suas roupas de molho para lavar. Mas eu estava feliz.

Matias voltou a ficar tranquilo durante o dia e mostrou fraldas carimbadas na maioria das trocas.

O cocô era, de novo, o nosso amigo.

 

(Hoje, Torero escreveu em azul e Rita, em preto)


Comparar bebês prematuros é cruel
Comentários 9

Barrigudos

Matias já veste RN! Esta semana comemoramos a perda de suas roupas de prematuro. Os bodys minúsculos já estavam muito apertados e difíceis de colocar, e o comprimento dos mijões já não era suficiente para o tamanho de suas pernas. Ele passou para o tamanho recém-nascido.

Para mim, a troca de numeração foi uma pequena-grande conquista, uma confirmação de que nosso filho está crescendo, engordando, e de que eu e Torero estamos conseguindo alimentá-lo e cuidá-lo. Para Matias, foi mais uma grande-pequena vitória na sua vida de prematuridade.

Mas, ao compartilhar a novidade com a família e amigos por telefone, percebemos que a maioria das pessoas se calava. O silêncio era uma espécie de pena, um constrangimento, uma interjeição oculta, que imaginávamos que queria dizer coisas como: “Coitado, já está com mais de 40 dias e só agora chegou ao tamanho de um bebê recém-nascido.” Até que alguém, em alto e bom som, confirmou nossas suspeitas dizendo: “Nossa, se só agora ele veste RN, antes ele deveria ser um ratinho. Como ele é pequeno!”

Sim. Temos uma criança que por um bom tempo será bem menor do que as outras da mesma idade.

Quando o assunto é bebê, o ideal de belo é ser grande, rechonchudo, cheio de dobrinhas. Um bebê prematuro não tem nada disso. As mães de bebês a termo sentem orgulho e enchem a boca quando dizem: “Nasceu com quase 4 Kg!”. As mães de prematuros sentem alívio quando seus filhos chegam aos 2 Kg.

Comecei então a imaginar várias situações pelas quais provavelmente passaremos quando um estranho perguntar a idade de Matias. Serão comuns comentários do tipo “Ele parece muito mais novinho”, “Ele é pequeno para a idade”, ou ainda perguntas como “Ele come bem?”.

O preço de ter um bebê que nasceu antes do tempo é a crueldade das comparações com os outros bebês.

A prematuridade de Matias me fez refletir sobre as projeções que fazemos para nossos próprios filhos, mesmo que de forma inconsciente.

Quem nunca desejou ter um filho galã de televisão? Ou um novo Einstein? Um campeão de MMA? Cantor? Jogador de futebol? Ou ainda uma filha miss, presidenta, executiva de sucesso?

No fundo, todas as mães secretamente querem que seus filhos sejam os maiores, os mais fortes, os mais espertos, os mais bonitos, os mais inteligentes, os reis-da-cocada-preta, os mais-mais. E quando isso é frustrado logo de cara?

No meu caso, houve um grande alívio nas expectativas em relação ao Matias. Não me importa mais se ele se tornará um baixinho atarracado, um sujeito de altura mediana ou um altão grandão. Há outras coisas com que se preocupar.

Com um bebê prematuro a gente passa a ser coadjuvante do crescimento do filho. Quem dita o ritmo é ele, a gente não controla nada. E tem que deixar de lado as convenções. A curva de crescimento dele não será igual a dos outros. E as comparações com outros bebês não farão sentido. Ele vai se desenvolver no seu próprio tempo, e eu só vou ajudá-lo.

Bebês grandes dão orgulho aos pais. Bebês guerreiros, como Matias, também.


Lição do dia: “A melhor roupa é a mais fácil de tirar.”
Comentários 2

Barrigudos

A frase acima parece ter partido de uma striper, mas veio de um pai que tem que trocar seu filho várias vezes ao dia.

Roupa de bebê deveria ser algo simples, que pudesse ser trocada com rapidez, sem que você tivesse prática nem tão pouco habilidade.

Mas não. Os sádicos designers da moda infantil inventam fechos variados, cortes transversais e mangas que parecem um treinamento para contorcionistas.

Meus dedos se embaralham tanto naquelas dezenas de colchetes que um dia darão um nó que só se resolverá com a amputação.

Matias está apenas há duas semanas em casa, mas já troquei tantas fraldas que apenas olhando para um body já sei quanto tempo demorarei para tirá-lo e colocá-lo. Apenas pelo corte do macacão já dá para saber se ele é simples como a calça do Hulk ou mais complexo que a armadura do Homem de Ferro.

Eu e Rita percebemos que as roupas mais espertas são aquelas que têm apenas os botões necessários e um corte que permite que você troque o bebê rapidamente, sem que ele fique nervoso e comece a chorar de desespero.

Por uma grande coincidência, estas logo se tornaram as mais usadas.

Em nossas compras iniciais, pensamos na beleza, na maciez e, é claro, no preço. Foi um engano. Beleza é fundamental, mas tirar a roupa rápido é mais importante. Doravante minha preocupação será na trocabilidade da roupa.

Como disse o filósofo tibetano Neng Nem Zing, “As roupas de uma criança devem ser como uma casca de banana para tirar e como um preservativo para colocar”.


Como ser pai de prematuro sem virar vampiro, zumbi ou Frankenstein
Comentários 1

Barrigudos

Em Guantânamo, um campo de prisioneiros mantido pelos Estados Unidos em Cuba, uma das técnicas de tortura é acordar o sujeito seguidamente, sem deixá-lo ter um sono longo.

Pois é exatamente isso que temos que fazer com um prematuro. Mesmo que ele esteja dormindo angelicalmente, temos que acordá-lo de três em três horas para alimentá-lo. Eles têm que ganhar peso rapidamente, mas são tão pequenos que não conseguem acordar quando têm fome. Não podemos esperar pelo seu choro de alarme.

E, para deixá-los despertos, antes de cada mamada há uma troca de fralda.

Por tabela, nós, pais, também fazemos esta tortura conosco. Até alguns dias atrás, o despertador do meu celular estava programado para apitar às 2h45, 5h45, 8h45, 11h45, 14h45, 17h45, 20h45, 23h45. Se escutar uma vez por dia aquela sirene já é horrível, imagine como é ouvi-la oito vezes. É preciso um autocontrole de monge budista para não botar o celular na frente da roda do seu carro e passar por cima. Com direito a marcha à ré.

Nos primeiros dias de Matias em casa, eu e Rita fazíamos todas as trocas juntos. Era uma demonstração de companheirismo, era um aprendizado conjunto das minúcias das trocas de fraldas, era o ato de partilhar a paternidade.

Balela!

Fazer tudo junto pode ser bonito, mas acaba com a resistência física do pai e da mãe.

Por conta dessa solidariedade, em poucos dias eu e Rita tínhamos olheiras tão profundas que parecíamos vampiros coadjuvantes num filme do Bela Lugosi.

A saída foi o rodízio. Não, não o de pizza. O de mamadeira.

Como Matias ainda toma um bom tanto leite artificial, decidimos que nas mamadas da meia-noite e das três da manhã só eu acordaria (o que explica o horário deste post). E as trocas das 6h00 e das 9h00 ficariam a cargo de Rita. Assim nós dois conseguiríamos dormir um tanto sem interrupções.

Deu certo. No começo eu me senti andando naquele passo lento dos zumbis, mas logo o corpo se acostumou. E as horas seguidas de sono foram sensacionais.  

Para Rita foi melhor ainda. Com o sono mais longo, ela conseguiu recuperar um tanto do leite, que começava a rarear.

E durante o dia estamos os dois mais espertos.

É claro que eu, como trabalho em casa, tenho uma certa vantagem sobre a maioria dos pais. Se trabalhasse numa empresa, entrando às 9h00 e saindo às 18h00, dificilmente poderia assumir o turno da noite. Mas hoje vários pais já trabalham em casa ou têm horários flexíveis.

Pode parecer menos romântico fazer as trocas de fraldas e mamadas separadamente. Mas é importante garantir que os pais não fiquem em pedaços como um Frankenstein.


Mães de prematuros precisam de licença-maternidade maior
Comentários 6

Barrigudos

Esta semana um cliente perguntou se eu poderia participar de uma reunião. Infelizmente, eu não poderia. Cuidar de um prematuro pede dedicação integral.

A volta ao trabalho é um problema sobre o qual eu e as outras mães conversávamos muito durante os dias que Matias passou na UTI.

Como faríamos quando voltássemos para casa? Quando conseguiríamos trabalhar?

Os quatro meses de licença-maternidade (ou seis, no caso das empresas-cidadãs) às vezes não bastam para a mãe de um prematuro. Não é raro que um bebê fique três meses na UTI. Ainda mais se for um prematuro extremo, que nasce entre 25 e 30 semanas de gestação e com menos de um quilo.

É o caso de Hadassa, que teve Maria Eduarda com 27 semanas de gestação, por conta de pressão alta desenvolvida na gravidez. Ela já está há mais de um mês e meio no hospital com Duda, que hoje pesa 1,4 Kg. Até atingir 2 Kg, peso mínimo para um prematuro sair do hospital, a licença-maternidade de Hadassa deverá estar próxima do vencimento.

Além disso, os primeiros meses fora do hospital são delicados. Como uma mãe vai sair para o trabalho e deixar seu prematuro? Se isso já é complicado no caso dos bebês comuns, imaginem com uma criança que ficou semanas ou meses na UTI.

Muitas vezes, quando a licença-maternidade vence, o bebê ainda está com dois quilos e pouco. Não há como deixá-lo numa creche. Os prematuros precisam de cuidados especiais. Possuem um calendário de vacinação diferente dos bebês que nasceram a termo. Ficam em quarentena, sem poder entrar em contato com outras crianças ou adultos, com risco de contraírem viroses ou infecções. Muitos também saem com medicações que precisam ser administradas corretamente, sem falhas.

Então, o que fazer quando se é mãe de um prematuro e a licença-maternidade venceu?

Algumas mães não têm outra alternativa e pedem demissão. Mas poucas podem abdicar do salário. Muitas voltam a trabalhar. Mas trabalham mal, pois sua cabeça, e seu coração, estão com o bebê, não com fornecedores, chefes e relógios de ponto.

Tramita no Congresso Nacional um projeto de lei que imita uma proposta que já funciona no Rio de Janeiro.

Ela propõe que a mãe possa acrescentar aos dias de licença-maternidade o tempo que faltava para a criança completar 37 semanas de gestação.

Não é o ideal, mas ajuda.

Em março, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania aprovou a admissibilidade da Proposta de Emenda à Constituição. Mas ela ainda será analisada por uma comissão especial e, em seguida, votada pelo Plenário da Câmara, em dois turnos.

É tudo muito lento. Enquanto isso, crianças não recebem a atenção necessária e mães ficam sem saber o que fazer.

A proposta original já tem cinco anos.

Fui checar como estava o andamento do proesso e vi que nos últimos cinco meses nenhum passo foi dado.

Os bebês vêm antes do tempo, mas a aprovação da lei já passou da hora.

Você pode assinar um apoio à lei aqui: http://www.avaaz.org/po/petition/Lei_do_Prematuro/?ceAzleb

ou aqui:  http://aleitamento.com/campanhas/lei-prematuro_assinar.asp

E um email para o seu deputado pode ajudar muito mais do que se pensa.

 

 


Barrigudos e Barrigudas na tevê
Comentários 2

Barrigudos

Hoje, à meia-noite, o programa Câmera Record vai falar sobre gravidez.

Uma parte será dedicada aos prematuros e às mães de UTI. Este interesse foi provocado, em parte, por um texto aqui do Barrigudos:  http://barrigudos.blogosfera.uol.com.br/2013/07/30/rotina-de-mae-de-uti-tem-lagrimas-e-aplausos/

Por isso, Matias e Maria Rita estarão no programa. Talvez até sobre uma ponta para mim. 


Lição do dia: “É preciso ter peito para aceitar que peito não é tudo”.
Comentários 2

Barrigudos

Depois que saímos da UTI, eu e outras mães nos correspondemos por email. Nossas dúvidas são muito parecidas. E, imagino, são as dúvidas de muitas outras mães de prematuros que leem este blog.

Por conta disso, eu e Torero criamos uma seção chamada ''Lição do Dia'', onde, em posts curtos, contaremos o que nós e outros pais estamos aprendendo sobre prematuros.

Hoje, por exemplo, o assunto é complemento de leite.

Algumas mães, quando saem da UTI e chegam em casa, tentam dar apenas o peito. E, às vezes, isso não basta. Ou porque o peito não tem muito leite, ou porque o bebê é muito pequeno e não consegue sugar. Nestes casos, é fundamental oferecer o complemento (que pode ser tanto o leite materno tirado com bombas como o leite artificial). Isso mexe com a nossa vaidade materna, afinal, somos mamíferos e gostaríamos de alimentar nossas crias. Mas o bebê tem que vir em primeiro lugar.

Entre minhas amigas de UTI, são raras as mães que têm leite para suprir 100% da amamentação. E a maioria que tentou dar só o peito viu seu bebê ganhar pouco peso.

Os complementos artificiais melhoraram muito nos últimos anos e ajudam nestes primeiros dias da criança. Matias vem ganhando quase 40 gramas por dia, e estou usando uma combinação de 20% de leite de peito e 80% de complemento. É claro que espero que isso mude com o tempo. Mas, por enquanto, não tem jeito.

O que faço é sempre tentar dar o peito antes de usar a mamadeira. Assim Matias aos poucos está melhorando sua sucção e, nos últimos dias, tenho sentido uma melhora.

Tenho recorrido a vários expedientes para aumentar minha quantidade de leite. Tomo Chá da Mamãe, Plasil, bebo três litros de água por dia. Tudo conforme a orientação médica, é claro. E, o mais importante, tenho tentado descansar.

Nos primeiros dias com Matias em casa, meu leite quase secou. Eu estava muito cansada, dormindo muito pouco. Mas agora, depois de uma semana, já tenho conseguido dormir um pouco mais.

Como? Explicaremos no post de amanhã.